segunda-feira, setembro 13, 2004

Pintaremos o Sétimo

Wanda Bueno Lycarião, uma das mulheres mais refinadas que jamais conheci. Uma das minhas principais lembranças de minha querida avó são àquelas refentes às aulas de desenho que ela ministrava, tanto para os familiares como para outros alunos, em cursos que ela dava em sua própria casa, exatamente nas mesas que abrigavam as monumentais refeições às quais aqui já me referi.

Muitas são as pessoas que eu conheço e que eu ainda vou conhecendo que fizeram aula com minha avó. Praticamente todos os quadros presentes em sua casa foram feitos por ela mesma ou por algum familiar (aqui destaca-se minha tia Wanda Mirian, a Tia Wandinha). Duas foram as ocasiões nas quais ela ministrou-me aulas. Uma delas quando eu era criança e lá ia forçado, e outra quando já estava com meus 17, 18 anos, por vontade própria. Confesso não ter me dedicado devidamente em nenhuma das ocasiões.

Outra coisa que devo confessar é nós dois termos sido muito distantes pela maior parte de minha vida, só mantendo um contato razoável durante as férias, mas ainda assim distante. Apenas nos últimos anos tal situação tem mudado. Mesmo que tenhamos convivido ainda menos nesses últimos anos (vejo-a no máximo três vezes ao ano, e em Varginha nossas casas não tem uma distância maior que uns 300 metros, além de eu ficar dias inteiros na lan house exatamente em frente à casa dela, sem nunca ir visitá-la) pude perceber que nossa relação tem sido bem melhor.

Também pude conhecê-la bem melhor dessa maneira. Ela sempre me pareceu ser uma mulher extremamente refinada, como realmente é, mas eu nunca havia percebido quão resignada ela era. Sobre seu refinamento, ela é daquelas mulheres que nunca estarão desmazeladas, mas sempre conservam-se arrumadas de uma maneira extremamente sóbria, sem muitos enfeites ou penduricalhos, também, nunca a vi trajando roupas de cores chamativas. Uma memória que me vem à mente foram as palavras que foram proferidas pela única namorada que tive até hoje, ao ver as unhas de vó Wanda: "Nossa, mas suas unhas são maravilhosas !"

Até aquele momento nunca tinha percebido, mas realmente, nunca a vi de unhas descuidadas. Outra coisa de nota é ela portar-se realmente como uma "Lady", raramente falando e, quando falando, sempre falando de uma maneira calma, pausada e sempre pesando cada uma de suas palvaras, proferindo-as sempre com imenso cuidado. Mas agora irei falar sobre sua resignação, que confesso ter sido um tanto chocante para mim.

O caso é que um tio meu estava em viagem, passando perto de Varginha, e, ficou combinado que ele passaria na casa de minha avó para os dois se reencontrarem, já que eles já não se viam há um bom tempo. Minha vó realmente estava ansiosa por tal encontro. Mas, por um desafeto do meu tio estar na casa dela no exato momento em que ele ligou para avisar estar lá indo, foi-lhe feito um pedido para que não se dirigisse diretamente até lá, passando antes pela casa de um outro familiar. Infelizmente, meu tio não gostou desse apelo, e decidiu que lá não mais iria passar.

Minha vó se controlou de uma maneira sublime, e continuou a recepção ao visitante. Assim que este foi embora, ela se virou para mim quase aos prantos, falando que meu tio não mais iria passar lá, e que ela iria tentar ligar para ele, tentando contornar a situação. Porém, essa sua resolução de ligar para meu tio novamente foi tão incrivelmente débil, e ela duvidava tanto que faria qualquer diferença, que tenho certeza que, mesmo ela querendo muitíssimo ver meu tio, ela não ligaria. Insisti para que ela ligasse para ele, finalmente tendo sucesso. Claro, meu tio, um homem razoável, rapidamente atendeu ao pedido de minha avó. Eu não tinha a mínima dúvida de que um telefonema o faria voltar atrás, mas minha vó tinha uma certeza tão absoluta de que de nada adiantaria o telefonema e quaisquer outros esforços que eu fiquei realmente chocado.

Só então percebi como ela sempre foi realmente uma figura secundária em sua casa. Não raro conflitos entre a família faziam-na sofrer de uma maneira incrível, mas ela quase nunca entraria na briga. Apenas se resignava e esperava o conflito se acalmar. Mesmo que para isso passasse por uma dor atroz. Ao contrário da Dinda ou da Vó Ede, a Vó Wanda jamais conseguiu se tornar uma mulher realmente independente. Isso é um tanto estranho e paradoxal, já que ela nunca se viu financeiramente submetida ou dependente assim como minha Vó Ede ou até mesmo a própria Dinda.

Lembrem-se que tanto minha Vó Ede quanto a Dinda sofriam um veto ao trabalho, imposto pelo meu avô Jair. Já o Seu Lyca, até mesmo incentivava a Vó Wanda a trabalhar, sendo que ela seria até mesmo mais economicamente ativa que ele, pois os três L anseiavam por se verem novamente publicados em um jornal local ou algo parecido, mantendo-se concentrados em trabalhos intelectuais. Ou seja, mesmo que economicamente Seu Lyca dependesse mais da Vó Wanda que ela dele, a submissão dela à ele era maior que a submissão de minha Vó Ede e da Dinda ao Vô Jair. Realmente, só agora percebi tal estranho paradoxo.

Infelizmente, da Vô Wanda não conheço muitas histórias que poderiam enriquecer este post, mas, muitas são as histórias dos antepassados dela, assim como as histórias da própria família Bueno. Porém, assim como as curiosidades de Seu Lyca, tratarei de diluir tais sabores ao longo dos vários posts que ainda temos pela frente.

Peço perdão aos leitores pela pobreza do post, já que meu conhecimento passa a ser quase ridículo. Assim como minhas memórias. Amanhã, veremos os filhos de Dona Wanda e Seu Lyca.
Relembrando, José Damião, Obededon Antônio, Eurico Rogério, Lecticio Luiz e Wanda Mirian.

Acho que teremos um post para cada, excetuando-se Lecticio, já que este, é meu pai. E sem dúvida é um dos personagens que originou várias das melhores e mais saborosas histórias que eu conheço.

Imitando o Pernalonga (que eu detesto):
That´s All Folks !

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